Estabelecer um contrato de diferenciado para um empregado ou acordar questões como jornada de trabalho e remuneração individualmente é um grave risco para as empresas na Justiça Trabalhista, apontam advogados.
Os juízes do trabalho, segundo os especialistas, costumam colocar a o texto da lei acima de qualquer caso específico se não houver pelo menos uma negociação sindical envolvida na alteração das condições de trabalho.
De acordo com o sócio da área trabalhista do Barbosa, Müssnich, Aragão (BMA), Luiz Marcelo Góis, como a lei é construída para defender o trabalhador, o empresário deve sempre ter cuidado com acordos firmados individualmente, pois podem eventualmente ferir o princípio da irrenunciabilidade à proteção da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). “Quando as partes atuam de comum acordo com um ato de renúncia a um direito, a empresa pode sofrer no futuro se o empregado voltar atrás e entrar com ação”, explica.
Assim, na opinião dele, a companhia deve sempre priorizar as negociações coletivas com o sindicato em casos de alteração na carga horária de trabalho ou de redução de remuneração. “Quando a empresa faz alterações dessa natureza sem a presença do sindicato, o risco de incorrer em um passivo judicial é muito alto”, avalia Góis.
Um caso recente exemplifica isso. Um restaurante fast food da cidade de Pelotas (RS) foi condenado a pagar uma hora e meia a mais de trabalho para uma funcionária que fazia intervalo para o jantar pouco depois do começo do expediente. A lanchonete deixava a empregada ter a pausa de uma hora para alimentação e descanso às 16h30, meia hora depois do início do trabalho. O entendimento da 11ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT4), foi de que o intervalo fruído nesses termos não atende à finalidade da norma que prevê um período de repouso e alimentação para recuperação das energias.
Caso a caso
O advogado trabalhista do Adib Abdouni Advogados, Akira Sassaki, lembra que esse processo se torna mais complexo por conta da especificidade do horário da funcionária. “O intervalo clássico é entre 12h e 14h para a jornada de 8h às 17h. Mas quem trabalha, por exemplo, das 17h às 00h, vai quase sempre fazer o intervalo logo no início da jornada, porque muitas vezes não haverá mais restaurantes abertos quando o empregado estiver no meio do dia de trabalho”, observa o especialista.
Para Sassaki, não é tão simples nesse caso enxergar algum dano à trabalhadora que justificasse a sentença negativa, mas a simples infração ao artigo 71 da CLT serviu para que a empresa fosse condenada, já que não houve convenção coletiva que legitimasse aquela jornada alternativa.
Góis lembra de outro caso, ocorrido no Rio de Janeiro, que é semelhante a esse. “Os trabalhadores de uma farmácia que ficava localizada em uma comunidade concordaram com uma redução de 30 minutos no intervalo do almoço para que pudessem sair meia hora mais cedo. O pedido foi realizado porque às 19h começava o movimento de uma boca de fumo que ficava perto do estabelecimento, e a redução do horário de trabalho dos funcionários para às 19h30 teria um efeito benéfico em termos de segurança”, conta o advogado.
Mesmo assim, a Justiça do Trabalho, condenou a empresa quando um ex-empregado entrou com processo para receber indenização por causa desse menor intervalo de almoço.
“Muitas vezes, a coisa se agrava mais quando a negociação é entre um único empregado e o empregador, porque parece que houve coação. Quando os funcionários decidem em assembleia e o sindicato não concorda, em tese, há o amparo da coletividade dos empregados para levar à diante a alteração”, afirma Góis.
Apesar disso, o sócio do BMA ressalva que mesmo casos assim, se são judicializados, enfrentam um entendimento do Tribunal Superior do Trabalho (TST) de que não dá para afirmar com segurança que a coletividade dos empregados foi respeitada se o órgão que defende os funcionários não deu seu aval.
Reforma
O sócio trabalhista do Mattos Filho, Domingos Fortunato, acredita que problemas como esses poderão ter soluções melhores com a Reforma Trabalhista enviada ao Congresso pelo governo Michel Temer. Segundo ele, o ponto que mais agrada no texto é o da prevalência do acordado sobre o legislado. “É um avanço considerável, mas vamos ter que olhar para uma possível reforma sindical”, ressalva.
Fortunato considera ser perigoso dar mais força para os acordos se os sindicatos forem fracos já que a lei brasileira só permite um órgão de defesa dos trabalhadores por região. “Poderia existir 15 [sindicatos], mas apenas o melhor sobreviveria. Todo monopólio piora a qualidade do serviço”, aponta.
A sócia do Andrade Maia Advogados, Maria Carolina Seifriz Lima, vê racionalidade na flexibilização de assuntos como a questão dos intervalos. “Às vezes algumas indústrias ficam longe dos centros e é melhor reduzir o intervalo, reduzindo também a carga horária. Com a reforma, as empresas vão poder se adequar melhor”, conclui a advogada.
Fonte: DCI